Leio
Hollywood pela terceira vez e a cada dia me convenço que Bukowski
teria sido um bom amigo não fosse o fato de ter morrido dez anos
antes de eu o ter conhecido.
Mais que
amigo, Bukowski seria um daqueles caras com os quais eu não teria
pressa de entornar uma boa garrafa de vinho e que chamaria de irmão,
temos muito em comum.
Quanto
mais leio Bukowski mais me identifico. Os personagens do “ultimo
maldito americano” são seu alter-ego e, inexplicavelmente, o meu
também.
Não que
eu seja igual a Chinaski, não, eu sou o Bukowski que deu certo ou,
talvez, seja o contrário.
Bukowiski
teve a glória do sucesso, eu tenho a glória de ser pragmaticamente feliz.
Leitores
inveterados dirão que Bukowiski feliz não seria genial, concordo,
não sou genial !
Henri e eu
temos, entretanto, esse compromisso visceral com a arte e com o
prazer e esse incômodo com a sina de ter que trabalhar para
sobreviver enquanto a vida passa. Ambos gostaríamos de ser
sustentados por uma rica mulher que nos permitisse cantar até de
madrugada, escrever e dormir durante toda a manha – driblando assim
o tempo que nos consome. Ele até que tentou, eu me arrasto da cama
todo dia muito cedo.
Mas o
tempo passa e a gente nem sente. Tenho uma filha de 21 anos, agora
não dá mais pra negar: estou envelhecendo. Vejo o alvoroço das
meninas na saida de faculdade, estão lindas, lembro uma época
memorável onde eu também era apenas um estudante, os recreios, as
musas da ocasião, hormônios, hormônios...
De repente
a palavra estala nos meus ouvidos: “Pai !” E depois: Tio, tio...
tio... pode deixar a gente no Shopping ? Putz... sou um velho safado
mesmo ! Cheguei aos quarenta e quarenta é uma idade que eu sempre
achei que caia bem para o meu pai, não para mim. De repente virei o
cara da sukita e nem percebi.
E existe
no meio de tudo todo um patrulhamento ideológico pro-envelhecimento.
Existem ritos obrigatórios de envelhecimento que implicam em
abandonar certas coisas e aderir a outras coisas "de velho"...
isso é que me chateia !
A
sociedade estabeleceu um estatuto onde envelhecer é também morrer
vivo.. ir perdendo as funções, inclusive as sexuais (esqueça o
viagra por enquanto) – obrigatoriamente. Mantenha suas aptidões ao
longo dos anos e seus mais rotineiros hábitos vão virando
excentricidades e depois coisas ridículas e depois perversões senis
!
Eu uso
bonés ! Sim... uso bonés. Sempre usei.
De uns
tempos pra cá as pessoas me olham de boné e dizem: só quer ser
garotão, de boné né ? Quer esconder a careca ? Putz, voltem o
filme, sempre usei boné, eu juro ! Mas agora não é mais permitido,
você tem quarenta, portanto, mostre a careca !
Quando
penso no meu futuro acho que serei um “nojento” velho safado.
Pois é... espero aos oitenta ainda admirar a beleza noviça de uma
linda garota no esplendor dos seus dezoito anos e quem sabe, com a
licença poética de um vovô, dizer até uma gracinha. Digo isso com
todo o medo das hostes dos caçadores de pedófilos e faço logo
minha defesa, a beleza é universal e existe algo na juventude que
enfatiza a beleza feminina. Juro, essa consideração é somente
estética !
Minha mãe,
que descobriu uma forma plácida e conformista de envelhecer me dá
conselhos diários: “meu filho, você não é mais pra agir assim,
você ta ficando velho... ! Putz mãe, logo a senhora que me ensinou
a ser artista ?
Há... vou
ler Bukowski, ele sim foi um homem inteligente, soube conservar seus
vícios. Como disse, o velho Buk é um irmão mais velho, estamos
unidos por esse compromisso com o prazer e com o belo e esse
inconformismo com a morte e com o envelhecimento que, em última
instância, parece que é o que nos lança para a arte como
derradeira forma de existirmos depois de nós mesmos.